* Rabino Isaac Benzaquen
O mundo
que construímos amanhã é feito das narrativas que hoje contamos aos nossos
filhos. O que
gera a liberdade? A revolução nas
ruas? Os protestos em massa? Uma guerra civil? Mudanças de governo? A derrubada da velha guarda e sua
substituição por uma nova?
Os
livros do Êxodo e do Deuteronômio adotam um caminho completamente
diferente. É surpreendente como, ao
refletir sobre a jornada dos israelitas da servidão à liberdade, Moisés se veja
retornando sempre a um ponto que se sobressai aos demais: o que e como
ensinamos aos nossos filhos. “Quando
seus filhos lhe perguntarem isto, responda-lhes assim.” “Ensine a seu filho nesse dia.” “Diga a seu filho...” Por quatro vezes,
Moisés trata do dever dos pais de educarem seus filhos, transmitindo-lhes a
história do nosso povo até que esta se torne a própria história deles.
E é
isso o que fazemos em Pessach: reunimos nossa família ampliada para
reconstituir a noite de muito tempo atrás, quando nossos ancestrais se
aprontaram para deixar o Egito e começarem a longa caminhada rumo à
liberdade. É uma memorável cerimônia, o
ritual religioso mais antigo e continuamente observado de que se tem notícia no
mundo, remontando a milhares de anos.
Ainda comemos matzá, o “pão da aflição” seco e não fermentado, e
provamos o maror, “as ervas amargas” da servidão. E as crianças ainda permanecem no coração
dessa celebração. Pois somente podemos
contar a história em resposta a perguntas feitas por uma criança. Daí que, para tantos de nós, a lembrança
judaica mais remota é a das quatro perguntas, começando por “Por que esta noite
é diferente das outras?” Continuamos
fiéis à determinação de Moisés: antes de mais nada, ensine aos seus filhos.
Moisés
nos ensinou que o mundo que construímos amanhã é feito pelas histórias que
contamos hoje a nossos filhos. A
política move as peças. A educação muda
o jogo. Se almejar uma sociedade livre,
ensine, então, a seus filhos como é a opressão.
Conte a eles quantos milagres são necessários para chegar até ela, a
liberdade. Sobretudo, estimule-os a
fazer perguntas. Ensine-lhes a pensar
por si mesmos. Consiga que eles
continuem com a herança, não por meio de uma obediência cega –que é a pior
preparação para a liberdade–, mas, sim, pela conversa ativa e desafiadora que
se perpetua através das gerações. Foi
assim que aprendemos, quando crianças, sobre a longa caminhada rumo à
liberdade. Foi assim que passamos a
adotar a história de nossos ancestrais como sendo a nossa.
Dentre
todas as conversas sobre os grandes desafios que afligem o mundo neste século
XXI – mudanças climáticas, a economia global, a confusão da política, o impacto
da nova tecnologia – pouco se fala ou se pensa sobre a educação e, mesmo quando
isso é feito, o foco bate no lado errado, como, por exemplo, nas habilidades
técnicas. A educação é de longe o
determinante de maior importância do futuro da raça humana e o que e como
educamos e ensinamos nossos filhos é a decisão mais importante a ser tomada.
Devemos
ensinar nossos filhos que a liberdade só vem quando se respeita a liberdade dos
outros e que isto envolve tanto responsabilidades como direitos e significa
fazer sacrifícios pelo bem comum. D-us,
o poder supremo, interveio na história há muito tempo, para auxiliar uma nação
de escravos, absolutamente sem poder algum, e desde então Ele nunca lhe
faltou. A obra Dele deve se tornar a
nossa obra. Assim também, não podemos
ensinar essas coisas sem dar às crianças, aos nossos filhos, o espaço e a
margem para perguntarem e questionarem, aprendendo, dessa maneira, a dignidade
da dúvida e da divergência, em si mesmos elementos básicos da liberdade.
A
liberdade não nasce dos campos de batalha, mas, sim, dos lares, das escolas e
das casas de estudo. Esta é a mensagem essencial do ritual mais antigo do mundo,em
Pessach, e sua força permanece irredutível até os dias de hoje.
Moadim
Lesimchá! Chag Sameach!
* Rabino
Isaac Benzaquen (Sinagoga Shel Guemilut Hassadim)
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